Como somos influenciáveis

Matéria publicada em nossa coluna sobre vinhos no site Bella da Semana, no mês de Fevereiro/2013.

Sugestões, influências, condicionamentos e outros são situações que desafiam todo degustador de vinhos. A maioria ou talvez todas as degustações são influenciadas por algum motivo, mesmo as realizada às cegas, ou seja, que não se tem informação sobre os vinhos a serem degustados, como marcas, regiões, uvas, preços etc.

Poderia escrever uma lista com todas as situações que condicionam uma degustação, mas a matéria seria muito extensa, ainda assim, faltariam algumas. Igualmente, citarei alguns exemplos como estado de ânimo, saúde, alimentação prévia à degustação, horários, hábitos de consumo, concentração, ambiente, companhia e conhecimento.

Um exemplo de como somos influenciáveis é colocar um degustador frente a seguinte situação: servir duas taças com o mesmo vinho e falar que são vinhos distintos. Com certeza ele buscará diferenças, e pode ser que até as encontre. Como muito pode dizer que não existem diferenças significativas, mas raramente falará que se trata do mesmo vinho. É difícil o degustador admitir que não encontra diferenças entre os dois vinhos.

Outro exemplo de degustação interessante, no entanto, precisa de maior produção: servir duas taças com um mesmo vinho branco, mas um deles tingido com alguma substância corante para que pareça vinho tinto. Claro que esse produto não deve alterar nenhuma característica de aroma ou sabor. Neste caso, com certeza o degustador irá procurar nesse vinho características típicas de vinho tinto, tornando esta situação similar à anterior.

Poderia continuar citando exemplos, mas quero focar numa situação em particular, da qual certamente algumas pessoas que estiverem lendo esta matéria já tenham passado pela mesma experiência.

Um casal faz uma viagem e visita uma vinícola. Percorre os vinhedos, degusta as uvas. O engenheiro agrônomo explica todas as etapas realizadas para obter uma uva de qualidade, essencial para elaborar um bom vinho. Em seguida o casal passa a visitar o interior da vinícola. Conhece os processos de produção, a sala de barricas, o engarrafamento e a cave, onde ficam os vinhos guardados até atingir o momento ideal de consumo. Depois se dirige à sala de degustação. O enólogo ou até o dono da vinícola, que conduz a degustação, fala de todo esforço, dedicação e paixão colocados para elaborar o vinho degustado, que ao final é considerado como um filho. Tudo isso fecha com alguma refeição e produtos típicos da região, excelentemente harmonizados com vinhos da vinícola. Esta experiência torna-se inesquecível.

Esse casal retorna para casa, à rotina diária e, aí, começa a parte mais interessante dessa história. Eles, em algum momento, desejam provar novamente aquele vinho que degustaram na vinícola. Compram o vinho numa loja, na cidade onde moram, e criam a expectativa de repetir a experiência daquele vinho. Abrem a garrafa, degustam, e percebem que não é igual àquele da vinícola. Algumas pessoas até devolvem a garrafa para a loja dizendo que não é o vinho que degustaram na vinícola, o qual eles conhecem muito bem. Acreditem, isso acontece.

Tecnicamente não existem duas garrafas iguais. Cada uma delas tem sua própria evolução, características individuais. Pode, sim, haver uma diferença entre a garrafa degustada na vinícola e a que foi comprada na loja, geralmente sutil, mas nem sempre é fácil perceber. Por outro lado, a forma e o tamanho da taça e a temperatura de serviço do vinho na vinícola podem diferir às de sua casa, e isso faz muita diferença. Mas há outra questão, que tem a ver com a experiência na vinícola, o estado de ânimo, o entorno, a companhia, o momento e como esses fatores influenciam na apreciação do vinho, que pode fazer com que um vinho bom pareça muito bom. As experiências são únicas e não se repetem. Gerar grande expectativa, muitas vezes, acaba em frustração.

Sem dúvida, somos influenciáveis. Mas quanta importância tem para um consumidor? É a mesma que para um degustador profissional? Minha resposta é não, embora dependa muito do objetivo das degustações. O importante é não esquecer o maior dos objetivos, que é beber e desfrutar do vinho.

Mario R. Leonardi

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