Matéria publicada em nossa coluna sobre vinhos no site Bella da Semana, no mês de Novembro/2012.
Decantar significa separar o sólido do líquido, uma prática utilizada para vinhos com presença de sedimentos. A ferramenta usada para realizar este processo é o decanter, um recipiente de cristal ou vidro que historicamente foi utilizado pelos europeus para decantar seus vinhos. Nessa época não clarificavam ou filtravam, portanto, continham sedimentos e o uso do decanter era muito comum. Atualmente os vinhos saem das vinícolas perfeitamente limpos e não é necessário utilizá-lo como antigamente.
É normal que nos vinhos tintos, com o passar dos anos, apareçam sedimentos. Isso é um sinal natural de envelhecimento, que faz parte da vida de um vinho. Esses sedimentos são compostos de matéria corante, taninos e outros. Portanto, esse vinho perde substâncias responsáveis pela estrutura, digamos, parte de sua ‘coluna vertebral’, que o torna frágil.
A presença desses sedimentos, muitas vezes, nos indica que o produto está chegando ao fim da sua vida. A crença de que ‘o vinho quanto mais velho melhor’ é mito, já que cada produto possui seu ciclo de vida, que pode ser maior ou menor, segundo as suas características. Somente uma pequena porcentagem dos vinhos tem grande potencial de guarda.
A questão é: devemos ou não decantar o vinho, e qual o resultado desta ação? Nada nos impede de tomar um vinho com os sedimentos, embora a presença deles possa alterar algumas percepções, como a da textura, a da estrutura e a dos aromas de boca ou retronasais, por exemplo. Em alguns casos, podemos até perceber gostos mais amargos e adstringentes.
Para fugir destas alterações, o melhor é cuidadosamente transvasar o vinho para um decanter, para que somente passe o vinho limpo ao recipiente e os sedimentos fiquem na garrafa. Como falei anteriormente, esse vinho é frágil e, nessas circunstâncias, devemos serví-lo logo sobretudo se for um vinho de muitos anos, já que um prolongado contato com o ar pode fazer com que se perca o bouquet e ganhe oxidação. O oxigênio dá vida, porém, pode também quitá-la.
Um pouco de ar
O decanter também é utilizado para oxigenar alguns vinhos, geralmente jovens e encorpados, que se encontram ´fechados´ aromaticamente falando, ou ainda têm seus taninos jovens e duros, algo adstringente.
Muitas vezes, ouvimos dizer que uma garrafa de vinho tinto deve ser aberta meia hora ou até mesmo uma hora antes de ser consumida. Desta forma, a bebida se oxigena e torna-se mais expressiva aromaticamente e gustativamente. Na realidade essa oxigenação é ínfima, já que o vinho tem pouco contato com o ar. A cavidade do gargalo da garrafa é muito pequena e precisaríamos de muito tempo para produzir o efeito desejado.
É melhor serví-lo numa taça e deixá-lo por alguns minutos antes de tomá-lo. Assim, terá muito mais contato com o ar, principalmente se girarmos o vinho na taça. Então teremos um processo maior de aeração e, mais ainda, se o colocarmos num decanter por trinta minutos ou uma hora.
Alguns vinhos com falta de madurês, certo desequilíbrio, adstringentes ou algum defeito, podem beneficiar-se com uma prolongada aeração no decanter. Já um vinho de boa qualidade, equilibrado e maduro, pode até ser prejudicado. Uma aeração prolongada faz com que características sejam perdidas, como o caráter e parte do bouquet, formado ao longo do tempo. Neste caso, a bebida poderá ficar mais suave e macia, porém mais neutra.
Antes de tomar qualquer decisão, é importante degustar o vinho, fazer uma avaliação e só depois definir se é necessário colocá-lo num decanter.
Se você tiver dúvidas sobre a utilização do decanter e seus benefícios, recomendo fazer o seguinte teste: pegue duas garrafas de um mesmo vinho, coloque uma delas no decanter por mais de uma hora e deixe a outra fora. Depois deguste e compare os dois. Assim você verá na prática qual é o efeito causado na bebida pela oxigenação.
Vale lembrar que sempre é bom ter um decanter em casa, sobretudo se você é um apreciador de vinhos. Afinal, em algum momento você pode precisar!
Mario R. Leonardi
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